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Violência doméstica contra as mulheres negras cresce no país

"Apesar da Lei Maria da Penha, as mulheres negras continuam sendo assassinadas sem a proteção do estado e sem a proteção do movimento de mulheres. Onde foi que a gente errou? Como nos últimos 10 anos foi possível que o assassinato de mulheres negras aumentasse 54%?"

A pergunta de Jurema Werneck , da Criola, para as participantes do II Diálogo Nacional sobre Violência Doméstica, é uma questão central para muitas das organizações apoiadas pelo Fundo Fale Sem Medo.

No debate sobre a conjuntura política da luta pelo fim da violência doméstica que abriu a programação do terceiro dia do II Diálogo, Jurema destacou que 64% das mulheres assassinadas no Brasil são negras e que, das 2,4 milhões de mulheres que sofreram violência em 2013, 1,5 milhão são negras.

Para a ativista, apesar de a Lei Maria da Penha ser premiada internacionalmente e de a Lei do Feminicídio ser uma inovação jurídica, tais conquistas legais não estão garantindo a proteção das mulheres negras.

“A Lei Maria da Penha, que foi uma luta do movimento de mulheres, não impediu um único assassinato das mulheres negras. Muito pelo contrário: os assassinatos, depois da Lei Maria da Penha, continuaram a subir”, diz Jurema. “Nada alivia essa falha, mas o que explica essa falha? A gente precisa falar sobre isso”.

Jurema contou ainda que a Criola, organização de mulheres negras fundada em 1992, e o Geledés – Instituto da Mulher Negra, de 1988, foram denunciar o governo brasileiro na Organização dos Estados Americanos (OEA) no dia 7 de abril.  “Fomos denunciar a falha do estado brasileiro em proteger a vida das mulheres negras”, diz Jurema.

"Segundo informações do Mapa da Violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil,  no período entre 2003 e 2013, o número de homicídios das mulheres negras saltou de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. Em contraposição, houve recuo de 9,8% nos crimes envolvendo mulheres brancas, que caiu de 1.747 para 1.576 entre os anos. As vítimas de crimes violentos são mulheres jovens, a maioria entre 18 e 30 anos, negras e pobres. O estudo mostra ainda que 50,3% das vítimas são assassinadas por familiares e 33,2% dos crimes são cometidos por parceiros ou ex-parceiros. A partir destes dados podemos induzir que mulheres negras são as principais vítimas da violência doméstica no Brasil”, diz Suelaine Carneiro, do Geledés – Instituto da Mulher Negra.

Confira aqui a participação de Jurema Werneck no II Diálogo Nacional sobre Violência, no debate que contou também com contribuições de Djamila Ribeiro (Colunista Boitempo Editorial e Carta Capital), Denise Dora (Defensoria Pública do RS), Flavia Oliveira (GloboNews), Aparecida Gonçalves (Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres), Valeska Zanello (Instituto de Psicologia da UnB e representante do Conselho Federal de Psicologia no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher) e Silvia Pimentel (CEDAW- Comitê para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação  contra a Mulher). 

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Projeto desenvolvido pelo Geledés visa ampliar a compreensão das particularidades que da questão da violência doméstica contra as mulheres negras

Os números assustadores de violência contra mulheres negras  foram o ponto de partida do projeto Mulheres Negras e Violência: decodificando os números, que o Geledés vai desenvolver em 2016 com apoio do Fundo ELAS e do Instituto Avon. O projeto visa ampliar a compreensão das particularidades que envolvem a questão da violência doméstica contra as mulheres negras.

“Conversaremos com mulheres negras que vivenciam ou vivenciaram situações de violência doméstica de forma a compreender suas condições de vida, a dinâmica de violência, suas percepções sobre racismo e sexismo. Realizaremos também rodas de diálogos com profissionais que atuam em Centros de Atendimento para Mulheres Vítimas de Violências, para conhecermos suas práticas de acolhimento e atendimento, e se há especificidades na situação de vitimização das mulheres negras”, explica Suelaine Carneiro.

 “O projeto será finalizado com um seminário nacional para apresentação pública dos dados e informações sobre as especificidades da violência sofrida por mulheres negras, de forma a contribuir com novas ações no campo do enfrentamento das violências contra as mulheres”, acrescenta Suelaine.